3.10.09

Existe mais de um de tudo

Segunda feira, seis e quarenta, eu levanto, a Claudia já arruma as roupas das crianças. Café, pão, leite com toddy, estamos com um carro só, porque bateram no Átila, o uno. Seis e cinqüenta, eu levo a Claudia para a escola dela, perto de casa. Volto, acabo de acordar os retardatários, mando escovar dentes, ajudo a colocar um tênis, se for o caso e se a tarefa estiver muito difícil. Levo todos para a escola. Deixo o carro na escola da Claudia e vou caminhar.
Depois da caminhada, coloco umas roupas na máquina e escolho o sabão. Humm, acho que vou experimentar o Ace líquido azul e misturar com um pouco de Vanish branco. Coloco a roupa e saio correndo de perto da máquina porque, vocês sabem, tenho uma atração irresistível em ficar observando roupas rodando no meio da água e do sabão.
Arrumo as camas, passo uma vassoura de espuma, úmida, pela casa. Passo bem porcamente, como se eu fosse uma daquelas empregadas rápidas e ineficazes que somem, assim que terminam o serviço do dia.
No meio de tudo isso, dou umas tuitadas, checo meus emails e jogo conversa fora, rapidamente, no MSN, enquanto estendo as roupas no varal. Não tem jeito, não existe sabão em pó que tire encardido de meia branca. Tem que esfregar com uma escovinha daquelas para unha, sabem? E só depois, deixar de molho e depois lavar.
O almoço vai ser meio fácil, frango à passarinho, arroz, salada (acabei esquecendo de fazer), salsicha, purê de batata yoki e suco uval. Quase tudo de ontem.
Onze e quarenta, a Claudia chega, nós almoçamos, excepcionalmente sozinhos, e eu vou buscar as crianças mais cedo, na escola, por conta de estarmos com um carro só.
Meio dia e cinco, crianças em casa, lavar as mãos, almoçar. Meio dia e meia, saímos todos para levar a Claudia na outra escola dela. Ela fica lá, levo o Nico e a Sofia para a casa da minha mãe e parto com o Joca para a terapia dele.
Deixo o filho lá e vou passear na galeria do Marcelo, conversar um pouco, porque é ali perto. Depois de uma hora, pego o Joca e voltamos para a casa da minha mãe.
Chegamos lá e a Claudia, que terminou suas aulas, está no Cenourão, com o resto da prole, fazendo as compras de frutas da semana. Tudo está (quase) feito. Principalmente se desconsiderarmos o fato de que a maior parte das lições de casa ainda nem estão perto do seu final.
Nós tínhamos um plano secreto para esse dia, eu e a Claudia. Olhamos para o relógio e percebemos que ainda dá tempo. Apressamos as coisas, crianças são colocadas para correr e pegar cadernos e mochilas incompletas. Partimos todos em direção ao lar. Deixamos frutas e legumes na geladeira, pegamos alguns elma chips e, finalmente, revelamos para a galera, nosso plano secreto: Vamos para o cinema!
Todo mundo se anima, a velocidade volta a ser uma constante em nossos corpos.Lá vamos nós pro UCI, a pé, porque é perto. Balde de litro de pepsi na mão e o filme, prestes a começar.
Fomos ver a nova animação da pixar, Up – Altas Aventuras. É sobre crianças, velhinhos, cachorros, amizade, amor e uma casa antiga voadora. Não sei se é por conta da música, não sei se é pelo clima nostálgico do início, mas me lembrei do Fellini. O tema musical é digno de um Nino Rota. Algo também cheira à Cinema Paradiso. Mastigo alguns cheetos, engulo um pouco de Pepsi. Começa uma sequência sem diálogos, só música e imagem, contando toda vida do casal, até à meia idade.
Sim, sim, eu choro. Choro muito, porque nunca consigo resistir a uma boa combinação de imagens-passar do tempo e uma melodia de piano com pinta de Morricone. Vocês pensam que estou brincando, mas eu choro mesmo! Sei que na outra ponta (as crianças estão entre nós) a Claudia também chora copiosamente.
O casal do filme tem um sonho. Juntam dinheiro numa vasilha de vidro e, constantemente, usam o dinheiro guardado para consertos, imprevistos, e têm que começar tudo de novo. Lembro de minhas vendas no quantopagas, do sonho classe média-ladeira-abaixo de comprar um sofá bem gostoso com chaise para ver seriados na TV. Mas não é que vem um caminhão, sem seguro, e arregaça com a lateral do Átila? Lá se foi metade do cofrinho para a franquia! Mas não é que o cano da máquina de lavar louças está fazendo chover na cozinha do vizinho de baixo? E dá-lhe cofrinho. Igual ao filme.
A sensação de identificação traz conforto. Meus problemas únicos, pessoais e intransferíveis, são de todo mundo. É como se estivesse conectado com o resto da humanidade, em tudo que faço, menos em ir ao banheiro. Único e igual a todos, ao mesmo tempo.
Existe mais de um de tudo. Seu dia especial, seu carro batido, seu vazamento no vizinho. E seu pequeno sonho que enche e esvazia, repetidas vezes, também não é só seu. Está tudo lá no filme, está tudo aqui dentro de nós.

2 comentários:

gil disse...

cleido. tava com muita saudade das suas belas cronicas da vida mais, ou menos, ordinaria. valeu, gil.

CDicas disse...

gil, obrigado! e vc ainda recebe pela minha lista? andei perdendo uns emails no meio do caminho...