23.1.05
Pequeno tesouro escondido
Existe um pequeno tesouro escondido nas prateleiras da música brasileira que, por estar escondido, quase ninguém conhece. Em 1976 eu escutava rock progressivo, uns led zeppelins, uns beatles, umas músicas renascentistas e medievais, caetano e gil (chico eu achava muito sambinha pro meu espírito cosmic-pós-adôla). Meu negócio era sintetizadores e qualquer outro gerador de ondas que fizesse um som do espaço sideral. Por mais que eu pareça eclético, visto de agora, eu não era. Tinha muitos preconceitos musicais.Tinha problemas com rock cantando em português e, apesar do pezinho bater ritmadamente ao som do disquedeu-disquedá-disquedeusdará, também tinha com a mpb mais tradicional. Nessa minha vida de escutar músicas, dos ray coniffs de meu pai, das connie francis e rita pavone dos irmãos, o meu próprio caminho eu descobri no rock pesado e viajandão dos setenta. Enquanto minha persona sonora ia sendo criada, dois amigos foram muito importantes nesse processo. Esses amigos não me disseram nada. Apenas coexistiram comigo sendo do jeito que eles eram. Um, o Plauto, me emprestou um microscópio e me ensinou a ver dentro das músicas, suas partículas, suas linhas de baixo, seus contratempos e ritmos. Com isso, abriu em minha cabeça, um universo quântico de pecinhas de sons subatômicos que se encaixavam e se tranmustavam num todo sublime e (quase) sempre coeso. O outro amigo, o Goiaba, me emprestou um telescópio e me ensinou que era possível escutar Gentle Giant e Taiguara, ao mesmo tempo. Que o mundo também se abria para fora e que existiam tantos universos paralelos musicais quantas probabilidades tivéssemos de criá-los. Que chiclete se misturava com banana. Que a tribo dos raveistas, dos metaleiros, dos punks, dos sambistas, dos bossanovistas e dos clássicos existiam mais como uma necessidade do espírito do que da carne. Nesses longes anos-setenta, o Goiaba me mostrou um vinil do Taiguara chamado Imyra, tayra, ipy que é uma verdadeira jóia (quase) perdida. Naquela época, acostumado que estava com as músicas-suites dos progressivos, prestei atenção no vinil do taiguara, primeiro porque o "lado A" era todo interconectado, formando uma só música e segundo, porque ele tocava alguns teclados eletrônicos "moderníssimos", que só os tecladistas de rock usavam.Um deles, pelo timbre, deveria ser um sintetizador arp (concorrente inglês do americano moog) e o outro era um mellotron, avô jurássico dos samplers que funcionava com rolinhos de fitas gravadas e cabeçotes, um para cada tecla/nota. Hoje em dia o pearl jam, o filho do lennon, os los hermanos e os modernos de plantão ainda usam para dar um xiste sonoro-retrô. Mas foi assim que descobri esse belo disco, que tem melodias inspiradas, arranjos monumentais de orquestra, percussões e bandoneões, violões e eletrônicos "living together in perfect harmony". O hermeto toca flauta e fez alguns arranjos, tem o toninho horta, o novelli, o nivaldo ornellas e o wagner tiso, ou seja a turma do milton antes dele ir na boléia do caminhão e virar um chato. Tem algumas letras datadas, sul-americanas, umas coisas meio mr8, mas não chegam a datar o trabalho inteiro. É um belo trabalho, tão belo e inédito em cd (parece que só a emi japonesa lançou) que eu, por conta própria, passei do vinil para o computer, limpei chiados e riscos, fiz capinha, encarte, selo e imprimi tudo e fiz duas cópias: uma para mim e a outra mandei pro goiaba.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário