20.12.04

Filmes Loucos

(novembro de 2003)
Já assisti alguns filmes loucões na minha vida, histórias louconas. Nem vou falar daquela fase 70, onde tudo era cifrado, nóis queria abaixo a ditadura e tudo, enfim, era louco e moderno. Assim nao vale muito mais, na minha conta atual. As modernices do Bunel e seus fantasmas da liberdade, suas inversões de códigos culturais, cagar em conjunto, à mesa, e comer escondidinho, surrealices que ajudaram a formar nossos espiritos loucos da juventude.
E aquele polonês cheio de consoantes? (alguem aí poderia comprar uma caixinha de vogais e ofertar para a língua polonesa?) que fez a Isabele Adjani cortar o pescoço com uma faca elétrica e transar com um alien gosmento feito pelo mesmo criador, Carlos Rambaldi (?), do alien do Riddley Scott. E nóis saia do cinema, ia pro bar e ficava: "vc viu que o agente da repressão usava meias pink?" "Será que a personagem de Adjani ao rejeitar qualquer vínculo de afeto com seus semelhantes projeta, inguá um ectoplasma materializado, seu furor emocional na forma de uma proto-criatura que é o próprio símbolo de seu inconsciente saturado em conflito com o ambiente socialmente hostil da alemanha oriental, pré-queda do muro? Sim, criaturinhas, graças a Deus!, todos nós fomos suficientemente tontos um dia para frequentar aquelas sessões malditas de filmes de arte, naqueles cinemas podreiras, à meia noite, com aquela imagem desfocada e cheirinho de mofo veludo um-dia-fui-carmim das poltronas rangentas. Fomos tontos para assistir 3 horas do "o idiota" do Kurosawa e nao sair, porque se nao todo mundo iria ver e perceber que vc nao deu conta da profundidade e da chatice do dito cujo. Pois é, filmes loucos sempre existiram. Histórias loucas. E o Liquid sky? Que tinha um disco voador que se alimentava dos junkies viciados em heroina e dos orgasmos dos punks. Os marcianos eram viciados nas endorfinas liberadas pelo cérebro. Modëééééééé'rno!!!!!
fim do prólogo
(é bebé, isso foi só a introdução)
O filme mais loucamente criativo que vi (já faz algum tempo) foi o "Quero ser John Malkovich". A história é muito louca. Não é como nos filmes do David Lynch (meu louco predileto) que a história pode até ser normal, mas ele faz questão de complicar, enrolar, climatizar e fazer a gente nao entender nada. A única coisa que eu li sobre o David Lynch que resolveu meu problema de nao entender nada e gostar muito, foi num ensaio (acho que na www.criticos.com.br, procure pela materia sobre o dvd do "cidade dos sonhos") que dizia o seguinte (acho!): que nossa relação (como espectadores) com o cinema está muito atrasada ainda, que faz muito tempo (desde o modernismo do começo do século passado) que nas artes plásticas, já deixamos de querer entender uma pintura, por exemplo, que podemos apenas apreciá-la com o sentimento. E é isso aí, dizia a matéria, que o cinema do David Lynch precisa ser assistido com os sentidos, nao com o cérebro. Ou melhor, precisa ser SENTIDO, não compreendido.
Ah, mas nao era do David Lynch que eu queria falar. Quero falar dos dois filmes mais meta-meta-meta-linguístico que já assisti na life: Quero ser John Malkovich (uma piração do roterista em que as pessoas fazem fila e pagam para serem, entrarem na mente de John Malkovich por quinze minutos) e o filme seguinte da dupla (Spinke Jonze - diretor, Charlie
Kaufmann - roteirista) chamado "Adaptação".
Recomendo assistir os dois filmes em sequencia, primeiro o john e depois o adaptação. É que o segundo começa com um gancho do primeiro. O roteirista do primeiro é o personagem principal do segundo. Ele é um roteirista adaptando um livro para um filme. O roteirista existe mesmo, o livro que ele está adaptando existe também. A autora do livro que está sendo adaptado existe de verdade, só que no filme ela faz coisas que não fez de verdade. No filme, o roteirista tem um irmão gêmeo que ajuda ele escrever o roteiro do filme que estamos vendo, tá la no credito. Só que esse irmão só existe no filme, mas não de verdade. Complicado? Assista e depois se divirta na internet procurando o que existe, existiu e o que não é verdade. Pérola pura. Algumas pessoas não entenderam o espírito da coisa. Acharam que o filme não decola e de repente muda completamente de direção. Mas quem prestar atenção nas sábias palavras do roteirista professor que dá algumas dicas para o nosso roteirista personagem, verá que tudo que acontece no filme foi o que o roteirista de verdade aprendeu no curso que ele fez (de mentira) no filme. Meta, meta, meta linguagem até o último dos moicanos. E nem vou falar aqui que o filme também trata do termo adaptação no sentido darwiniano, biológico, mesmo porque vou ter que entrar naquele assunto da genética que nao serve pra nada e o pessoal vai ficar nervoso de novo (brincadeirinha!) Nao percam e leiam os creditos até o final. Aliás, até a trilha sonora subverte a ordem e termina (nos últimos suspiros dos creditos) num crescendo ao invés de ir morrendo docemente como toda boa trilha que se preze.

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