(junho de 2004)
odeio quando vejo meu lixo esfaqueado, violentado por pessoas que procuram coisas recicláveis nele e não têm a educação de deixá-lo do jeito que ele estava antes, ou seja, arrumadinho, fechadinho e não fedidinho. Como é difícil viver nesse mundinho classe média, que fica nervoso cada vez que o mundo externo insiste em revirar nossos restos, nossas excreções sociais. Aprendi muito com o pessoal que revira o lixo do predinho onde moro. Aprendi, passado o acesso de fúria inicial, que se eu matasse eles (mais uma vez, os matasse acho feio!) com um rifle de miratelescópica, calmamente sentado numa cadeira perto de minha janela do segundo andar; se eu matasse pelo menos um, só um, para servir de exemplo, só um vai? Pois é, aprendi que não sairia impune dessa empreitada, que não teria o apoio dos colegas de minha classe média tendendo a mínima, que diriam: "coitado! tem trigêmeos, descompensou!" Eu sei, eu sei, nós não somos uma classe unida. Mesmo porque, grande parte pensa que não é média, pensa que é alta, que vão sequestrar nossos filhos para pedir resgate e, por isso, nem se identificaria com minha dor. Mas tudo bem, passada a fase de descontrole emocional, percebi que tenho muito a aprender com os miseráveis e mal educados que nem amarram meu lixinho, depois de revirá-lo na cata de latinhas e papelões e pets. Aprendi que se eu separasse tudo que fosse reciclável, em saquinhos, eles iriam parar de rasgar o resto todo, aqueles cães malditos de arquelau! Meus vizinhos ainda vão aprender, pois tenho fé na raça humana. Eu também aprendi que se eu ponho o lixo muito tempo antes do lixeiro passar, um dia antes, aumentam as chances daqueles mal-educados rasgarem ainda mais meus preciosos saquinhos de não-quero-mais. Malditos miseráveis! eu aqui, classe média-ladeira-abaixo, com mestrado, doutorado, pós-doutorado e tendo que aprender com eles a separar, classificar, reciclar e conviver em sociedade!
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